A pastora de cabras que virou favorita ao Oscar 2021: o caminho de Amanda Seyfried rumo ao sucesso

by @prflavionunes

Cercada de grandes lagos, frondosos bosques e pitorescas colinas, a pouco mais de duas horas e meia de carro ao norte de Manhattan, encontra-se a região dos Catskills. Lá, onde famílias judias norte-americanas iam veranear durante a segunda metade do século XX, deixando-se entreter por promissoras artistas durante os jantares de gala —como Broadway Danny Rose e The Marvelous Mrs. Maisel se encarregaram de registrar posteriormente— surgiu também Amanda Seyfried. A atriz, conhecida por filmes como Mamma Mia!, tomou a insólita decisão de ir embora de Los Angeles em plena maturidade profissional para se instalar em uma fazenda cercada por mais de 20 animais. Seus agentes tentaram demovê-la, mas foi inútil. O cuidado com as cabras, galinhas, cavalos, gatos, um burro e um cachorro chamado Finn, com mais de 80.000 seguidores no Instagram, monopolizam atualmente a maior parte da sua agenda, além do tempo com seu marido, o também ator Thomas Sadoski (The Newsroom) e suas duas filhas. “É incrível como posso me sentir realizada e bem-sucedida sem ter que trabalhar em um filme de grande repercussão”, dizia a intérprete em uma entrevista recente. Agora, terá que comprovar o que sente ao estar em um dos filmes mais elogiados do ano.

Foram necessários 15 anos para que Hollywood se ajoelhasse pela primeira vez perante Amanda Seyfried. Graças ao seu papel como Marion Davies, a musa e amante do magnata William Randolph Hearst em Mank, a artista de 35 anos conseguiu despontar como favorita ao Oscar —e a qualquer outro prêmio que aparecer no caminho— de melhor atriz coadjuvante. Segundo o site especializado Golden Derby, que reúne e compara milhares de previsões de editores, críticos cinematográficos e usuários, Seyfried dobra nas apostas a segunda da lista, Olivia Colman (por The Father). “Maravilhosa”, “incrível”, “é o melhor do filme” e “merece o Oscar” são alguns dos comentários que veículos como The Guardian e The Washington Post publicaram sobre o trabalho dela. A repercussão de sua aparição no filme de Fincher, sobre a origem e rodagem de Cidadão Kane, conseguiu unir seu melhor momento profissional e pessoal, transformando sua história em inspiração para todos aqueles que, como ela, convivem com uma doença mental.

Sua confissão, em uma entrevista de 2016 à revista Allure, teve um grande impacto na Meca do cinema. “Uma doença mental é algo que as pessoas categorizam de forma diferente de outras doenças, mas não acho que deva ser assim. Deveriam ser tomadas tão seriamente como o resto”, dizia Seyfried, que revelou sofrer de TOC (transtorno obsessivo compulsivo) desde os 19 anos. Diagnosticado por causa de frequentes episódios de ansiedade, desde então toma um antidepressivo para manter a enfermidade sob controle. O primeiro conselho de seu agente foi que ocultasse sua condição para não pôr em perigo o seu promissor futuro no cinema, mas, conforme contaria no site Mr. Porter, essa não era uma opção para ela. “Pensei: ‘Danem-se!’. Quero que as crianças que estão tendo pensamentos estranhos possam compartilhá-los sem estigmas. E se isso afeta a minha carreira, que seja”. Seu dia a dia atual, afastado do agito de Hollywood, e a maternidade (em setembro deu à luz seu segundo filho) ajudaram-na a melhorar seu estado de saúde. “Um pai ou uma mãe são é uma criança sã”, defende.

Foi também aos 19 anos que ela começou com tudo na sua trajetória cinematográfica, no elenco da comédia geracional Mean Girls. Vivia Karen, uma das três populares alunas que enfrentam a personagem interpretada por Lindsay Lohan. Embora seu papel fosse secundário, se ganhar um Oscar será a primeira a conseguir isso naquele promissor elenco (que incluía Rachel McAdams e Tina Fey, entre outras). Depois, encontraria seu espaço como protagonista de diferentes comédias românticas com aspirações maiores, como Cartas para Julieta e Querido John, e em comercialmente bem-sucedidas adaptações de musicais como Mamma Mia! e Os Miseráveis.

Nos últimos tempos, porém, apostou na discrição e muitos achavam que sua fulgurante aparição havia se amortizado, mas o fato é que poucas atrizes conseguiram reunir um currículo mais florido. Seyfried se pôs às ordens de diretores respeitados como Rodrigo García, Atom Egoyan, Andrew Niccol, David Lynch, Paul Schrader e, agora, o mencionado Fincher. “Todos sabíamos que Amanda era luminosa, todos sabíamos que era efervescente, todos sabíamos que era divertida”, diz sobre ela o realizador de Mank, que encheu de lágrimas os característicos olhos da atriz quando soube que o cineasta contava com ela para seu esperado projeto. Outro ilustre, Quentin Tarantino, deu-lhe, em um encontro casual num aeroporto, o conselho que mudou sua vida: “Mantenha suas expectativas baixas, e se surpreenderá gratamente”.

Apesar de atualmente passar seus dias “passeando com as cabras”, a norte-americana se mantém grudada à atualidade através das redes sociais, onde demonstrou seu forte compromisso ativista. Além de atacar em numerosas ocasiões o presidente Trump (chamou-o de “ditador delirante”), Seyfried também utilizou sua popularidade em Hollywood — só no Instagram tem quase cinco milhões de seguidores — para arrecadar recursos e atuar como alto-falante de diferentes organizações beneficentes ou denunciar comportamentos sexistas fora e dentro de uma indústria onde diz nunca ter se sentido segura. Assim contou no The New York Times: “Puseram-me em situações muito difíceis. Tinha que passear sem roupa íntima nem camiseta, contra minha vontade, mas sentia que não tinha o poder para dizer, ‘Não, isto me faz sentir incômoda’”.

À espera de saber se as promissoras expectativas sobre seu futuro como dona da desejada estatueta dourada finalmente se cumprem, parece que sua recusa em seguir as regras e ordens dadas — “Não compartilhe seu estado de saúde, não vá morar fora de Los Angeles, não se envolva politicamente” — está se revelando a opção correta. Seu discurso no palco do Dolby Theatre, se é que a pandemia permitirá a celebração, promete ser dos mais inspiradores.

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