Os 50 anos de ‘What’s Going On’, a obra colossal de Marvin Gaye

by @prflavionunes

O titã do ‘soul’ Marvin Gaye, em uma imagem de arquivo.
O titã do ‘soul’ Marvin Gaye, em uma imagem de arquivo.

Sem necessidade de dizer muito mais, bastaria anotar o que disse Smokey Robinson, um imenso músico e compositor da Motown e uma das figuras mais importantes da música negra de todos os tempos: “What’s Going On é o melhor disco da história”. Essa afirmação, vinda de quem vem, é suficiente para entender que o trabalho mais pessoal e ambicioso de Marvin Gaye é imperecível. Meio século depois do lançamento, permanece como um farol que ilumina gerações de músicos.

No entanto, muito pode ser dito sobre esse disco que tinha quase tudo contra para alcançar o sucesso em 1971. De fato, muito já foi dito. Muita tinta foi gasta para lembrar como o chefão da Motown, Berry Gordy Jr. se opunha ao seu lançamento e via isso como prejudicial para o selo do “som da América jovem”, ou como as questões políticas que atravessam as canções, como a Guerra do Vietnã, a pobreza dos guetos norte-americanos, a injustiça social ou o ambientalismo puderam ser um problema para sua aceitação maciça; ou como a dor de Marvin Gaye pela morte de Tammi Terrell, sua amiga e parceira, era tão intrínseca ao esqueleto do disco que parecia impossível que pudesse ser tão luminoso. Porque What’s Going On, com aquele ritmo que flui e reflui sem parar entre as canções, é pura luz. É como um rio de luz, com seu estranho e hipnótico caudal sonoro.

O contexto de What’s Going On era tão complexo que, com mais motivo ainda, parece um milagre ouvi-lo tão orgânico, tão compacto, tão espiritual em suas diferentes ondas de soul, gospel, jazz, spoken word e pop. E também foi milagroso para muitos artistas que entraram nesse rio e saíram transformados. Meio século depois de sua criação, é uma boa oportunidade para fazer uma revisão de um bom punhado dos músicos que foram iluminados por What’s Going On, o disco com o qual Marvin Gaye alcançou um território inexplorado.

Sem sua conquista artística, seria muito difícil entender alguém como Prince, outro revolucionário do som, que compreendeu a importância de impregnar seus melhores trabalhos de atmosferas envolventes. Foi seu melhor discípulo. Mas há mais músicos que se movimentaram com esses parâmetros envolventes, vozes negras a serviço de uma causa sonora fluida. Os ensinamentos de Gaye podem ser vistos nas melhores versões de John Legend e Seal ou em alguns dos mais recentes talentos do soul contemporâneo, como Curtis Harding e Leon Bridges. Também em vozes femininas para reivindicar (e descobrir por parte do grande público), como Susan Archives.

What’s Going On é muito mais do que um grande disco de soul. É um gênero em si mesmo e, portanto, nele beberam outros estilos afro-americanos, como o hip-hop e o rhythm and blues moderno. Seu espírito paira sobre trabalhos absorventes de figuras desses gêneros como Kendrick Lamar, D’Angelo, Frank Ocean e Moses Sumney. E inclusive, em uma visão mais roqueira, o grupo Black Pumas é como se tivesse os predicados de Gaye tatuados em suas canções poderosas.

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