São Paulo chega às urnas sob suspense com três ‘segundões’ no páreo para enfrentar Covas no 2º turno

by @prflavionunes

Quatro anos depois do furacão João Doria (PSDB), os tempos são outros. O atual governador de São Paulo levou a prefeitura da capital paulista no primeiro turno em 2016 e agora tenta emplacar seu vice, o atual prefeito Bruno Covas (PSDB), para consolidar seu projeto político. Mas, agora, o cenário é mais complexo que há quatro anos. A Operação Lava Jato e o impeachment de Dilma Rousseff, que afetaram a imagem do PT e do resto da esquerda, já estão distantes da memória dos eleitores. Não que o PT tenha saído fortalecido desse processo. Pelo contrário. Mas, se antes Doria representava a novidade, hoje a surpresa se chama Guilherme Boulos. Um professor de 38 anos oriundo da classe média paulistana que decidiu militar no Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e viver na periferia. Mesmo concorrendo pelo PSOL, um partido ainda pequeno que conta com apenas 17 segundos de tempo de televisão, ele se perfila como possível rival de Covas no segundo turno, segundo as últimas pesquisas. O psolista disputa o segundo lugar com os veteranos Celso Russomanno (Republicanos) e o ex-vice-governador Márcio França (PSB). Nada ainda está decidido. Covas tinha neste sábado, véspera da eleição, 37℅ das intenções de votos válidos na mais recente pesquisa Datafolha. Em segundo lugar, Boulos 17%, França com 14% e Russomanno com 13% ―o que colocava os três em empate técnico, levando em conta a margem de erro.

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Na embolada disputa para saber quem vai se consolidar em segundo lugar, Boulos segue em ascensão nas pesquisas. Já Russomanno começou e terminou a campanha como sempre começa e termina uma campanha: aparecendo em primeiro lugar num primeiro momento e desinflando nas últimas semanas. França, por sua vez, desafiou Doria na eleição para governador em 2018 e perdeu por muito pouco: 51,7% para o tucano e 48,2% para ele. Por ter recebido mais votos que seu rival na capital paulista, acreditou que pudesse transferir seus votos para estas eleições municipais. A realidade se mostrou mais difícil do que aparentava.

Bruno Covas tem o sobrenome Covas, uma marca política em São Paulo respeitada até mesmo pela esquerda. O neto do ex-governador Mário Covas, morto em 2001, também leva como um trunfo a poderosa máquina eleitoral do PSDB e uma gestão de perfil social-democrata centrista —e sobretudo moderado, ainda mais se o parâmetro é o ultradireitista presidente Jair Bolsonaro— que dialoga com os vários setores da sociedade. Ganhou a empatia da cidade ao partilhar seu estado de saúde. O câncer que precisou enfrentar. Quando a pandemia chegou, ele ainda estava em tratamento. Mudou-se para o Palácio do Anhangabaú e levou o trabalho dali mesmo. Chega forte e seguro para a eleição deste domingo.

Poderá Covas repetir o feito de quatro anos atrás e vencer já no primeiro turno? Enquanto a resposta não vem, cabe ponderar o fator Boulos: os três candidatos que disputavam o segundo lugar em 2016 —Fernando Haddad, Marta Suplicy e Celso Russomanno— eram políticos veteranos. Boulos é praticamente uma novidade política (embora tenha disputado a Presidência da República em 2018), como era Doria há quatro anos. O candidato do PSOL, que vem diretamente de um movimento social, ofuscou inclusive o PT, que com o candidato Jilmar Tatto não consegue chegar a dois dígitos de intenção de voto, algo inédito nas últimas décadas de democracia.

A seguir, leia como foi a rotina dos três candidatos nesta reta final da campanha, quando correram para conquistar os últimos votos para chegar ao segundo turno.

Boulos vive a contradição nas periferias

por Felipe Betim

“Oi, eu sou o Boulos, moro aqui em Campo Limpo. Vamos levar a periferia para a prefeitura”. Era assim, com um panfleto de sua candidatura em mãos, que Guilherme Boulos se apresentava nesta quinta-feira para trabalhadores e trabalhadoras do bairro periférico onde ele mesmo vive, na Zona Sul de São Paulo. O momento é de entusiasmo pelo fato de o candidato do PSOL à prefeitura da capital aparecer em segundo lugar na última pesquisa Datafolha, numericamente na frente de Russomanno. Mas, a poucos dias das eleições municipais de 2020, sua campanha corre contra o relógio para torná-lo mais conhecido nas periferias. “Agora, nessa reta final, é a gente não descuidar. É a gente seguir na onda da virada, virando voto”, discursou Boulos para militantes, anunciando mais seis caminhadas em diferentes pontos da cidade para o dia seguinte, além de carreatas pela zona leste e pelo centro no sábado.

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Boulos vive uma contradição. Entre os candidatos à prefeitura de São Paulo mais bem posicionados nas pesquisas, ele é o único que vive na periferia. E quem, como líder do MTST, mais tem contato com a população vulnerável da maior cidade do Brasil. “A gente não aparece a cada quatro anos, a gente é daqui, a gente está aqui,estamos aqui nas lutas do dia a dia”, destacava Boulos ao longo da caminhada de quinta.

As pesquisas publicadas na última semana indicam que ele vai melhor entre os mais ricos e tem dificuldades justamente com a população de baixa renda e de menor escolaridade das periferias. O candidato psolista vence de Covas entre os eleitores de 16 a 24 anos (31%) e praticamente empata com o tucano entre os que tem entre 25 e 34 anos. O líder do MTST vence entre aqueles que têm ensino superior (29%). Aparece bem posicionado, com 27%, apenas quatro pontos atrás de Covas, entre aqueles com renda familiar mensal de 5 a 10 salários mínimos. E está em segundo lugar, com 26%, entre quem ganha mais de 10 salários mínimos. Porém, tem apenas 3% da preferência do eleitorado com o ensino fundamental completo e 12% com o ensino médio. Entre quem ganha até dois salários mínimos de renda familiar mensal, marca 8%; entre quem recebe de dois a cinco salários mínimos, 18%.

Com 17 segundos na PT, Boulos vem fazendo uma campanha bastante efetiva nas redes sociais, o que ajuda a explicar o apoio do público jovem. A figura do professor e líder de movimento social que abriu mão do conforto da classe média paulistana para morar na periferia, e que se movimenta por São Paulo em um carro popular —o “celtinha prata” que aparece em vídeos, jingles e todo tipo de material de campanha—, foi cuidadosamente construída por sua equipe. Ao mesmo tempo, Boulos não pode se dar ao luxo de prescindir de carreatas e do corpo a corpo com eleitores, um jeito mais antigo de se fazer campanha. É a forma de se aproximar com as pessoas pouco conectadas e que foram privadas de debates na TV aberta no primeiro turno.

Diálogo com evangélicos

São 13h37 de quarta-feira, 11 de novembro, e Boulos chega para um encontro com algumas dezenas de evangélicos de várias partes da capital. Sai o Boulos assertivo e irônico dos debates e entra Boulos ameno e aberto à conversa. Quer escutar o que as pessoas têm a dizer. “Nosso objetivo aqui nesse encontro é dialogar com os evangélicos de São Paulo. Vocês sabem que não é verdade que os evangélicos são todos bolsonaristas nem que todos que concordam com esse discurso de ódio”, começa dizendo o psolista. Se o eleitorado paulistano fosse apenas de evangélicos, Boulos teria 7% dos votos, segundo o Datafolha.

A conversa repetiu a dinâmica adotada pela campanha de Boulos em outras ocasiões. Uma roda de pessoas é formada e cada uma fala se apresenta para o candidato, que guia a conversa com um tom ameno, quase professoral —mas sem ser academicista. “Suas reivindicações são as reivindicações de milhões de pessoas nas periferias. Quando alguém está na fila do posto de saúde, ninguém pergunta se é evangélico, católico, umbandista, ateu…”, prosseguiu Boulos.

A imprensa só pôde acompanhar o início e o final do evento, mas a conversa se deu sobre a “necessidade de se inverter prioridades” em São Paulo. O psolista também repetiu para o eleitorado ali presente algumas de suas principais apostas de política pública. Entre elas, quer apresentar já em janeiro uma proposta de renda básica solidária de entre 200 e 400 reais para atender até um milhão de famílias que vivem com menos de meio salário mínimo por mês. Também projeta abrir concurso público para profissionais de saúde já em janeiro, com a promessa de reabrir hospitais fechados ou funcionando parcialmente, além de manter as Unidades Básicas de Saúde abertas a noite e nos finais de semana. Boulos garante que os custos desse ambicioso cardápio é de 29 bilhões de reais em quatro anos, sendo que 10 bilhões serão tirados do atual caixa da prefeitura e pelo menos 10 bilhões virão da cobrança da dívida ativa.

No dia seguinte, a caminhada pelo Campo Limpo começa em frente à padaria Ribeirinha, onde habitualmente Boulos compra pão. “Fizemos questão nesta reta final da campanha de fazer uma caminhada aqui. Pra mim isso é uma questão de honra. E marca também nossa diferença com relação a outros candidatos a prefeito”, afirma. Sai o Boulos popular nas redes sociais, entra o Boulos da política mais tradicional —aquela que vai às ruas com panfletos. “Se sou eleito, você vai poder trabalhar sem medo do rapa“, disse ele durante uns poucos segundos a um vendedor ambulante.

Ao longo de uma hora pela Estrada do Campo Limpo, o líder do MTST entrou em todo tipo de comércio, de mercados a loja de brinquedos. Em poucos segundos, atende a pedidos de fotos, destaca que sua vice será a deputada federal Luiza Erundina, “a melhor prefeita de São Paulo”, e repete o mantra dessa reta final de campanha: “Moro aqui em Campo Limpo, vamos colocar a periferia em primeiro lugar. Vamo que vamo”.

O tempo fechou para Russomanno

por Aiuri Rebello

Nublou o tempo na reta final da campanha de Celso Russomanno. Na quinta-feira (12), três dias antes da eleição, uma tempestade atrasou e atrapalhou uma caminhada do candidato pelas ruas de Heliópolis, comunidade humilde com 240.000 moradores na zona Sul de São Paulo. A chuva durou cerca de meia hora, mas foi o suficiente para esvaziar ainda mais as ruas do bairro e conferir um clima melancólico ao evento eleitoral do candidato que foi da liderança na corrida pela Prefeitura de São Paulo ao risco de não passar ao segundo turno em cerca de um mês e meio.

Com 14% das intenções de voto segundo pesquisa Datafolha divulgada na noite de quarta, Russomanno segue empatado dentro da margem de erro com Guilherme Boulos (PSOL), que passou a sua frente com 16%, e Márcio França (PSB), que pontuou 12%. Quando a campanha começou, quem liderava folgado era Russomanno com 29%, nove pontos porcentuais à frente do atual prefeito Bruno Covas, que tenta a reeleição.

Caso não passe para a próxima fase da disputa, seria a terceira vez seguida que Russomanno morreria na praia na luta pela prefeitura. Em 2016 ele também saiu na dianteira só para ver o hoje governador tucano de São Paulo, João, Doria, levar o pleito no primeiro turno. Em 2012, foi superado pelo petista Fernando Haddad e pelo senador José Serra, também do PSDB. No segundo turno, Haddad foi eleito.

Mais cedo naquela manhã em Heliópolis, antes da chuva, o deputado federal e apresentador da TV Record chegou de cara fechada, cansada e demonstrando irritação. Ao falar com os repórteres presentes, durante uma coletiva antes de uma reunião com lideranças comunitárias, discutiu bastante com alguns deles. Na noite anterior, o TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo) havia liberado a pesquisa do Datafolha que trazia as más notícias para o candidato. Dias antes, ele tinha conseguido uma liminar para impedir a divulgação da sondagem.

“Vocês perseguem o presidente Bolsonaro, isso não se faz”, ralhou com os jornalistas ao ser questionado sobre o apoio dele, declarado no início de outubro. “Vocês perseguem ele, estão me perseguindo também porque estou alinhado com ele, é muito triste isso”.

A opção da direção de campanha de colar a imagem do candidato à do presidente não rendeu os votos esperados na capital. Russomanno errou o timing da aposta. Se em 2018 Bolsonaro arrastou centenas de políticos para a vitória nas urnas, em 2020 o jogo virou. Os erros e as seguidas crises do Governo, muitas infligidas pelo próprio presidente, tornou Bolsonaro um personagem difícil. O mandatário é rejeitado por 50% dos paulistanos, revelou o Datafolha, o que exigia seguir a mesma estratégia de Covas em relação a Doria, hoje também com alto índice de rejeição: descolar sua imagem e perfilar-se sozinho. Isolado com um padrinho eleitoralmente tóxico a tira colo, o candidato viu até seus votos dentre o eleitorado evangélico minguarem.

Apesar da queda nas pesquisas, ele rejeita a relação entre uma coisa e outra e reafirma o apoio. “Na vida a gente tem que ter uma linha, não pode ficar em cima do muro. A minha é a defesa da família, da sociedade, em defesa da economia e da liberdade. Ele tem me dado todo o apoio. Vocês só querem falar das coisas ruins, dos problemas dele? Vocês têm que falar das coisas boas que estão sendo feitas por ele também”, afirmou antes da caminhada.

Russomanno, na verdade, credita ao poderio econômico da campanha do PSDB a perda da dianteira para Covas. “Ele tem muito tempo de televisão e dinheiro né. Devo chegar a um milhão e pouco de gastos, a dele já passou dos 16 milhões, só isso”, disse ao EL PAÍS durante a caminhada.

Nesta última semana, o candidato dos Republicanos participou dos dois últimos debates para a prefeitura, onde virou alvo dos adversários pela queda nas pesquisas. Defendeu-se atacando, especialmente Guilherme Boulous, acusando-o de contratação de produtora de modo irregular. Também foi à Justiça contra a divulgação das últimas pesquisas do Datafolha, por supostamente estar em desacordo com a legislação. Um juiz chegou a aceitar seu pedido, mas a censura durou pouco. Russomanno não teve sorte em suas investidas também contra Boulous, e o vídeo em que acusava o psolista precisou sair do ar. Também precisou conceder direito de resposta ao prefeito Bruno Covas depois de replicar uma notícia partilhada por Bolsonaro sobre a guarda metropolitana prendendo uma mulher. A cena aconteceu em Araraquara, mas o vídeo foi partilhado como se fosse na cidade de São Paulo.

Se teve negativas em suas investidas contra adversários, nas ruas ganha mais calor humano. Russomanno geralmente é reconhecido pelas pessoas, possivelmente pelos muitos anos de trabalho na TV. Em Heliópolis, era recebido com sorrisos e simpatia genuína pelos moradores e comerciantes que abordava, apesar da falta de entusiasmo geral. “Já vieram todos os candidatos aqui este ano, estamos acostumados com esse tapinha nas costas”, explica à reportagem um eleitor que passava pelo meio fio após o candidato entrar em uma venda.

“A comunidade está fechada comigo. Dá pra ver e sentir o carinho, as pessoas gostam do trabalho que a gente faz. Eu acredito muito nisso e vamos para o segundo turno sem dúvida”, dizia o candidato enquanto esgueirava-se por uma viela escura em meio a cabos eleitorais e assessores e entrava em uma casa convidado pela dona.

Márcio França, o ‘Biden paulistano’

por Breiller Pires

Escoltado por uma pequena comitiva de militantes, Márcio França (PSB) chega mais cedo que o previsto à maior unidade do Senai na capital paulista. O local escolhido para um de seus últimos compromissos de campanha tem menos a ver com a oferta de vagas em escolas técnicas, que ele pretende impulsionar caso seja eleito prefeito da cidade, e mais com o apoio que receberia no local. Diante da entrada principal, o candidato é ciceroneado por Paulo Skaf, presidente da Fiesp, Sesi e Senai, desbancado por ele no primeiro turno da eleição para governador em 2018, por apenas 0,44% dos votos percentuais. “Pode contar com a nossa parceria”, disse o anfitrião, sem manifestar endosso explícito à candidatura.

Além do empresário, França somou outra adesão importante à sua fileira de apoiadores na reta final da campanha. Iniciou a semana em ato com Ciro Gomes, figura-mor do PDT, que tem o vice Antonio Neto como representante na chapa com o PSB em São Paulo. “Márcio França nunca precisou ficar com lacração ou discurseira pra provar que está no campo da redemocratização, da luta pelos dos direitos sociais e da defesa do trabalhador”, elogiou Ciro ao citar a vitória do democrata Joe Biden nos Estados Unidos, pregando que a esquerda deveria, como no caso de Bernie Sanders, concentrar esforços em uma candidatura de centro para ter mais chances na eleição.

É dessa forma, como uma espécie de “Biden paulistano”, que o candidato da coligação Aqui Tem Palavra tenta se vender às vésperas da votação. De acordo com a última pesquisa Datafolha, ele aparece em quarto lugar, com 12% das intenções de voto, número semelhante ao de Ciro no último pleito presidencial, que inviabilizou sua passagem ao segundo turno. “Por ser mais moderado, Biden abocanhou votos no outro campo político e ganhou a eleição americana. Em São Paulo, eu sou o único que tem condição de derrotar o PSDB”, disse ao deixar o complexo do Senai. A baixa taxa de rejeição (14%, segundo o Datafolha) é o grande trunfo da campanha para tentar uma arrancada semelhante à de 2018.

França, 57, que já foi deputado federal e prefeito de São Vicente, na Baixada Santista, por dois mandatos, concorreu à reeleição ao cargo de governador que havia assumido no lugar de Geraldo Alckmin (PSDB). Considerado um político pragmático, transita com desenvoltura tanto pela direita quanto pela esquerda, a depender do balanço do mar em que se propõe a navegar. Dois anos atrás, acenou pelo voto útil aos eleitores de esquerda para superar Skaf no primeiro turno. No segundo, com o apoio do emedebista ligado à indústria e ao empresariado, preferiu se manter neutro no páreo presidencial para não desagradar as bases de Fernando Haddad (PT) nem desperdiçar votos na onda conservadora propagada por Jair Bolsonaro.

Na ocasião, ele perdeu a disputa, após uma campanha marcada por debates provocativos e acalorados, para o tucano João Doria, com que tenta rivalizar novamente na eleição municipal. Ao se referir ao atual prefeito Bruno Covas (PSDB), que lidera as pesquisas com quase 20 pontos de vantagem para o segundo colocado, França usa o apelido “Bruno Doria”, em referência irônica ao apoio do governador. Depois da visita ao Senai, participou do debate da Folha/UOL, em que qualificou Doria como um “contêiner eleitoral”, debochando da rara frequência de aparições do antigo adversário na campanha de Covas. Na última semana, dobrou a aposta no antagonismo com o governador. Bate na tecla de que, ao contrário de Doria, que descumpriu promessa eleitoral e trocou a Prefeitura pelo Palácio dos Bandeirantes, ele cumpriu seus mandatos e manteve a palavra com eleitores.

Em seu sprint para reverter a desvantagem nas pesquisas, França também ressalta propostas do plano de governo. A mais badalada contém um gesto calculado para a categoria dos educadores, que, no âmbito estadual, entrou em rota de colisão com Doria este ano. O advogado santista promete que, se for eleito, vai dobrar o salário dos professores da rede municipal. A fonte para bancar o aumento seria a economia com cargos comissionados na Prefeitura. “Só vou utilizar 1% dos 7.000 cargos ocupados por indicações de políticos ao prefeito”, diz França.

Outra estratégia da campanha tem sido mirar o apoio de nichos que garantam votos em setores progressistas e, sobretudo, na periferia, como o do futebol de várzea. Se comprometendo a valorizar os campeonatos amadores, França visitou comunidades e ganhou a simpatia de lideranças de times varzeanos. Chegou a se reunir com três equipes diferentes no mesmo dia. Em meio à comoção pela morte da cicloativista Marina Harkot, atropelada no domingo passado, o candidato manifestou indignação prometendo investir em “ciclovias adequadas e respeito ao ciclista”, apesar de seu plano de governo não detalhar como pretende melhorar a malha destinada às bicicletas na cidade.

Ao mesmo tempo em que busca capitalizar com o apoio de Ciro, avalista de sua experiência como gestor público, França mantém o jogo duplo em relação a Bolsonaro. Não critica nem se apega ao presidente, que, em São Paulo, abraçou Russomanno. Antes do começo da campanha, participou de um evento com Bolsonaro em São Vicente. Porém, resolveu marcar distância do bolsonarismo para evitar atritos com o PDT e, principalmente, por observar o desgaste da imagem do presidente, cuja rejeição já atinge 50% do eleitorado paulistano, de acordo com o Datafolha.

Para se posicionar como um candidato de centro-esquerda, França argumenta ser filiado há mais de três décadas ao PSB, seu único partido, e tem adotado rigidez ao tratar sobre a pandemia de coronavírus. Costuma usar máscara em todos os compromissos de campanha, como na visita ao Senai, onde só retirou o equipamento para gravar um vídeo para suas redes sociais, e sinaliza com medidas para estimular a economia sem, no entanto, desprezar a necessidade de isolamento social ou politizar a vacina como Bolsonaro.

Nos discursos de convencimento sobre sua viabilidade eleitoral, reforça que, em 2018, derrotou Doria na contagem de votos na capital. “Se o Bruno [Covas] ganhar, o Doria será presidente da República. Quem não quer o Doria presidente, vota em mim”, clamou França em um debate. Nesta quinta-feira, em visita à Cinemateca, ele brincou ao comparar o prefeito a um Kinder Ovo, que teria Doria como “surpresinha de brinde”. O comerciante Edson Alves, que passava pelo local durante a chegada do candidato, pediu para tirar uma foto e se declarou eleitor de França. “Eu estava indeciso. Mas como não quero mais saber desse prefeito nem desse governador aí, acho que ele é o melhor nome”, disse, arrancando um sorriso por trás da máscara de França. “Tá vendo, o povo não aguenta mais o PSDB.”

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