10 anos após Fukushima, energia nuclear ressurge como fonte limpa. Será?

by @prflavionunes

Há 10 anos, um terremoto no Japão fez o mundo lembrar dos perigos da geração nuclear de energia. O tremor de 9,1 graus na Escala Richter gerou uma série de tsunamis que atingiram em cheio o nordeste japonês, onde está localizada a usina de Fukushima. Algumas ondas chegaram a 40 metros de altura.

Dos seis reatores, quatro ficaram alagados. A inundação causou uma falha nos geradores de emergência da usina, responsáveis por manter em funcionamento o sistema de resfriamento das turbinas. Em pouco tempo, três reatores derreteram com o calor. Nos dias seguintes ao acidente, 154.000 pessoas tiveram de ser evacuadas dos arredores.

Especialistas estimam que 18.000 terabecquerels (unidade usada para medir partículas radioativas) de césium-137 foram parar no Oceano Pacífico. O governo liberou a volta dos moradores da região há apenas três anos, mas muitos ainda não consideram seguro. Não se via algo parecido desde Chernobyl.

É no mínimo contraditório que, dez anos depois da tragédia, a energia nuclear esteja sendo considerada como uma alternativa “limpa” para a transição energética, cujo objetivo é reduzir a emissão de carbono e salvar o meio ambiente. Nas próximas semanas, é esperada uma decisão da Comissão Europeia sobre o descarte de resíduos nucleares. Dependendo do que ficar estabelecido, o urânio pode ser rotulado como um “combustível de transição” no escopo da nova política energética do bloco, parte do plano de retomada econômica Green New Deal.

A classificação permitirá que projetos de usinas nucleares acessem fundos garantidos por governos e relacionados aos 700 bilhões de euros reservados pelo bloco para investimentos em energias com baixa emissão de carbono — apesar dos riscos, a geração nuclear, de fato, praticamente não emite carbono. Essa possibilidade interessa a países dependentes do carvão, como Polônia, República Tcheca e Bulgária.

Segundo dados da Agência Internacional de Energia, a geração de energia nuclear cresceu no ano passado. As usinas ao redor do mundo ofertaram 2.600 TWh de eletricidade, ante 2.586 TWh em 2019. Isso representa 10% da oferta global de energia e mais de 30% da produção de energia de baixo carbono.

Embora Fukushima tenha gerado movimentos de descomissionamento de usinas, com Alemanha, Bélgica e Suíça planejando desativar todos os seus reatores, a necessidade de se livrar das fontes fósseis, especialmente do carvão, faz alguns países olharem para a nuclear com mais carinho, fazendo vistas grossas para os riscos envolvidos.

Na semana passada, a China divulgou o seu 14º Plano de Cinco Anos, em que detalha algumas ações para cumprir seu compromisso de atingir a neutralidade em carbono até 2060. Como parte dos esforços, o gigante asiático pretende aumentar sua capacidade nuclear de 48GW para 70GW, até 2025. Isso vai requerer a construção de seis reatores.

Fusão para garantir a segurança

Em outra frente, cientistas estão avançando no desenvolvimento de uma tecnologia que pode, de fato, fazer da energia nuclear uma alternativa segura e viável para a economia de baixo carbono. A ideia é usar a fusão no lugar da fissão nuclear, como acontece atualmente. Em setembro do ano passado, foi iniciada a construção da primeira fase do reator, na cidade de Cadarache, no Sul da França.

O reator de fusão nuclear está sendo planejado e construído por meio de uma parceria entre Japão, Índia, União Europeia, Estados Unidos, Rússia, China e Coreia do Sul, desde 1985 — quando a Rússia ainda era a União Soviética. Uma parceria inusitada, mas que deu certo: há 19 anos foi completado o primeiro rascunho do projeto.

Ao contrário de outras plantas do tipo, que utilizam a fissão nuclear, processo que quebra o núcleo dos átomos em dois menores, o reator batizado de ITER (que significa “o caminho” em latim) será responsável pela fusão nuclear, que consiste na combinação de átomos em altas temperaturas.

Para que a fusão nuclear aconteça é preciso manter uma temperatura de 150 milhões de graus celsius — 10 vezes mais quente que o núcleo do Sol. O reator pesará 23 mil toneladas e é considerado o projeto mais complexo de engenharia na história da humanidade. Para a construção, serão necessárias 3 mil toneladas de ímãs, que serão conectados a cabos supercondutores de 200 quilômetros, mantidos a uma temperatura de -269ºC.

Apesar de complexo, o processo praticamente não gera lixo radioativo. Se for bem-sucedida, a iniciativa pode mudar por completo o mercado de energia e a economia, já que a humanidade terá uma fonte praticamente inesgotável de eletricidade. Mas, enquanto isso não acontece, é preciso decidir se vale a pena apostar em uma geração de baixo carbono, mas que, caso alguma coisa dê errado, pode causar danos ambientais e sociais incalculáveis. Talvez seja melhor esperar um pouco.

Fonte: Exame

Pr. Flávio Nunes

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