“Autorizar a vacina de emergência é correr um risco que não parece justificado”

by @prflavionunes

César Hernández, chefe do Departamento de Medicamentos de Uso Humano da Aemps.
César Hernández, chefe do Departamento de Medicamentos de Uso Humano da Aemps.AEMPS

A autorização concedida pelo Reino Unido à primeira vacina contra a covid-19 não é tão completa quanto a que a Agência Europeia de Medicamentos dará dentro de menos de um mês, explica César Hernández, chefe do Departamento de Medicamentos de Uso Humano da Agência Espanhola de Medicamentos e Produtos Sanitários (Aemps).

Pergunta. Por que a agência britânica foi mais rápida do que a europeia, a EMA?

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Resposta. Porque autoriza uma coisa diferente, uma espécie de uso compassivo, com requisitos diferentes de uma autorização completa, que é o que propõe o resto dos países europeus. A britânica e a que parece que dará a FDA [a agência norte-americana] são autorizações de uso emergencial, não de comercialização, com requisitos mais baixos. É como um uso compassivo, mas coletivo, como o que fizeram inicialmente com a hidroxicloroquina e o remdesivir.

P. Na prática, qual é a diferença? A autorização permite vacinar todo mundo?

R. A autorização será direcionada a alguns grupos especificamente, mas o mais diferente é o suporte de qualidade do produto. A agência inglesa anunciou que vai autorizar lote a lote, ou seja, terá de ir dando mais autorizações, enquanto uma autorização completa ―por isso leva mais tempo― permite seguir o fluxo habitual do resto das vacinas e medicamentos.

P. Isso influi na qualidade?

R. Uma das coisas mais importantes das vacinas e dos medicamentos biológicos é garantir que os lotes sejam iguais, que quando você os fabrica sempre tenham, por exemplo, a mesma quantidade de antígeno. E nessas moléculas que são tão complexas, onde é tão fácil que o RNA mensageiro se degrade, pequenas variações poderiam levar a mudanças nos efeitos.

P. Que outras diferenças existem?

R. No uso de emergência ainda não temos todos os dados do medicamento, mas temos dados parciais e como estamos em uma situação grave, neste caso em uma pandemia, mesmo faltando dados vale a pena autorizar. A legislação que o permite é comum ao resto dos países europeus. Outra diferença é que com uma autorização de comercialização a responsabilidade pelo produto é da empresa, enquanto que com o uso compassivo esta fica isenta porque não é um medicamento autorizado, mas um cuja distribuição é permitida devido à situação de pandemia e analisando o risco-benefício.

P. Outros países poderiam dar autorização de emergência?

R. Não acredito que o façam, porque isso romperia a harmonização e o consenso atuais.

P. Por que a EMA prefere respeitar seus prazos?

R. Em uma situação em que epidemiologicamente não parece que iremos piorar, para adiantar a vacinação uma ou duas semanas deveria haver um benefício potencial muito grande para o risco que se corre. Todas as decisões sobre medicamentos são baseadas nessa relação. Um risco muito grande pode ser aceito se você vai ter um benefício que o supera. Com um benefício incerto e com duas semanas para uma autorização completa, correr esse risco não parece muito justificado. E uma autorização concedida pela mesma via que o resto dos medicamentos contribui para gerar mais confiança nas pessoas.

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