Escândalo no Peru pela administração irregular de vacinas ao ex-presidente Vizcarra, ministros e altos funcionários

by @prflavionunes

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O escândalo desatado no Peru depois da confirmação, neste fim de semana, de que o ex-presidente Martín Vizcarra recebeu às escondidas uma vacina contra a covid-19 em outubro passado, quando ainda estava no poder, não para de crescer. A admissão do ex-mandatário fez disparar a indignação em um dos países mais golpeados pela pandemia, com mais de 43.000 mortes, e que se encontra às portas de eleições presidenciais convocadas para abril. As autoridades sanitárias investigam a administração das chamadas “vacinas de cortesia” da companhia estatal chinesa Sinopharm, enquanto ministros e altos funcionários reconheceram que se imunizaram sem anunciar ao público. Uma das últimas figuras políticas de primeira linha afetada pelo escândalo foi a chanceler Elizabeth Astete, que deixou o cargo na noite de domingo após admitir que se vacinou com a primeira dose em 22 de janeiro sem avisar ao atual presidente, Francisco Sagasti.

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Astete se vacinou com uma dose que chegou em setembro, como parte de um carregamento destinado a um ensaio clínico desse laboratório. Foi “uma decisão equivocada que não medi em seu momento”, afirmou a agora ex-ministra, em um comunicado que compartilhou no Twitter. Astete integrou a equipe negociadora encarregada das compras de vacinas, que culminaram, na primeira semana de janeiro, com a assinatura de um contrato com a Sinopharm. A demissão dela ocorre dois dias depois da renúncia da ministra da Saúde, Pilar Mazzetti, por causa da tempestade causada pela vacinação de Vizcarra e sua esposa. No sábado, foi substituída por Óscar Ugarte, quem em uma entrevista televisiva informou que vários funcionários – entre eles dois vice-ministros da Saúde – se imunizaram em setembro. Seu departamento encarregou uma investigação para determinar o número de pessoas que aceitaram as doses “de cortesia”.

Luis Suárez, um dos ex-vice-ministros apontados, também pediu demissão neste sábado. Em uma declaração divulgada na noite de domingo, ele argumentou que os pesquisadores da Sinopharm haviam informado que “assim como em outros países nos quais foram feitas pesquisas da fase III, eles punham à disposição a vacina candidata [experimental] com a possibilidade de proteger a equipe responsável por conduzir a resposta contra a pandemia e seu entorno direto”. Segundo o programa televisivo Cuarto Poder, o pesquisador-chefe desse ensaio clínico em Lima, Germán Málaga, da Universidade Peruana Cayetano Heredia (privada), decidia quem receberia as doses que sobravam após a imunização dos profissionais que mantinham contato direto com os voluntários do estudo. O número dessas doses chegava a 400.

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No sábado à noite, um comunicado dessa universidade esclareceu que Vizcarra não era parte dos 12.000 voluntários que participaram do ensaio, ao que o ex-mandatário e atual candidato a deputado respondeu no Twitter que lhe causava “grande estranheza” não figurar no cadastro de voluntários. O político afirmou também que não divulgou publicamente o uso da vacina porque isso “teria posto em risco o normal desenvolvimento do ensaio experimental”. Entretanto, as críticas que recebeu do presidente Sagasti, do novo ministro da Saúde e da presidenta do Congresso, Mirtha Vásquez, apontam para a falta de transparência do ex-chefe de Estado por ter se beneficiado de um produto de uma empresa com a qual a Administração manteria milionárias negociações de aquisições.

“Sinto um desconforto, para dizer o mínimo. Recursos estão sendo usados de forma alheia às normas. É algo que não deveria se repetir nunca. Todo aquele que se vacinou fica de fora”, afirmou o ministro Ugarte, citando a ordem do presidente Sagasti. O mandatário questionou seu antecessor. “É grave que o ex-presidente tenha tratado de justificar algo inaceitável. Sinto-me indignado e furioso, porque põe em perigo os esforços de muitos peruanos na primeira linha contra a covid-19. Ainda não consigo entender que alguns funcionários não tenham levado esta situação em conta”, afirmou numa entrevista pela televisão. De acordo com o jornal La República, pelo menos 50 altos funcionários dos ministérios da Saúde e Relações Exteriores se beneficiaram da vacina.

O Ministério Público informou que abrirá uma investigação contra Vizcarra e contra eventuais responsáveis pela gestão das chamadas “doses de cortesia” da Sinopharm. A Universidade Cayetano Heredia, em outro comunicado divulgado na noite de domingo, relatou que em setembro recebeu dois lotes de vacinas experimentais: um destinado ao ensaio clínico, e outro “de 3.200 doses para serem administradas voluntariamente ao pessoal da equipe de pesquisa e pessoal relacionado ao estudo”. Destas últimas, observa a instituição, não se manteve um registro.

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