Recessão na Argentina será a maior do G20 e PIB do Brasil encolherá 6%, diz OCDE

by @prflavionunes

Transeunte em frente a um estabelecimento comercial fechado por causa da pandemia em Buenos Aires, em julho passado.
Transeunte em frente a um estabelecimento comercial fechado por causa da pandemia em Buenos Aires, em julho passado.RONCORONI / EFE

A crise derivada da pandemia vai devorar a Argentina. O país sul-americano perderá neste ano 12,9% do seu PIB, mais do que qualquer outra economia do G20 – embora seguida, a não muita distância, pela Espanha e o Reino Unido –, segundo as projeções publicadas nesta terça-feira pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE, que reúne economias avançadas). As restrições por causa da pandemia farão estragos sobre um cenário que já tinha números vermelhos no primeiro trimestre, produto de dois anos de recessão, uma dívida externa em moratória e inflação disparada. As medidas sanitárias fecharam o círculo de um 2020 tenebroso, pior inclusive que o 2002 da crise do corralito, quando a atividade econômica argentina afundou 10,9%.

A recuperação, além disso, não será tão rápida como nos demais países incluídos na análise da OCDE: a Argentina crescerá 3,7% em 2021 e 4,6% em 2022, ficando a quase cinco pontos do nível prévio à crise. O Brasil e o México, as duas maiores economias latino-americanas, também cairão em 2020, mas o baque não chegará aos dois dígitos: 6% no primeiro caso, e 9,2% no segundo. Assim como no caso argentino, ambos chegarão a 2022 sem terem recuperado o PIB anterior à pandemia.

O capítulo da OCDE sobre a Argentina está carregado de advertências. Reconhece o trabalho “oportuno e audaz” do Governo para auxiliar empresas e trabalhadores (com recursos públicos equivalentes a 1,5% do PIB) durante o fechamento da economia decretado a partir de março. Mas diz que a emissão monetária para financiar o alto déficit fiscal produzido pelas ajudas gera uma pressão inflacionária adicional, quando a taxa dos últimos 12 meses já se aproxima de 40%. “Os crescentes desequilíbrios macroeconômicos (…) pesam sobre a demanda interna e limitam o ritmo da recuperação, apesar de uma reestruturação bem-sucedida da dívida pública com credores privados. O emprego caiu com força. O financiamento monetário do déficit pressiona ainda mais a inflação e a disparidade entre a taxa de câmbio oficial e a paralela [que em meados de outubro superar 100%]”, diz o texto.

O organismo antecipa que o dia seguinte à pandemia porá em evidência a fragilidade da economia argentina. Após a reabertura da economia, iniciada com medidas de distanciamento social, as ajudas públicas serão retiradas, o que provocará um aumento das “falências e perda de postos de trabalho”. “Isto se somará ainda mais ao alto desemprego e fragilizará a demanda interna. As pressões inflacionárias se intensificarão quando forem relaxados os rigorosos controles de preços e a demanda interna se recuperar”, diz o relatório.

Para reverter a queda e acelerar a recuperação, o organismo econômico insiste em estabelecer “uma estratégia fiscal confiável em médio prazo”, centrada em melhorar a eficiência do gasto público, junto a cortes nas isenções tributárias regressivas e nos regimes especiais, para “reduzir os desequilíbrios macroeconômicos”. Só assim, entende a OCDE, a Argentina poderá recuperar a confiança dos investidores e o crédito nos mercados de capital, hoje inacessível enquanto se espera um acordo com o FMI sobre a dívida em atraso com o organismo.

Recuperação lenta em Brasil e México

Argentina à parte, a América Latina como um todo deixa entrever uma recuperação desigual e muito mais demorada que a média mundial, que até o final de 2021 já teria superado o nível do PIB prévio à crise. Com algumas exceções, a tônica será a lentidão na retomada da vitalidade econômica: só um dos seis países analisados pela OCDE, o Chile, deve chegar a 2022 com uma atividade econômica maior do que havia antes da crise ―e mesmo assim por pouco: após a contração de 6% em 2020 se espera um crescimento de 4,2% e 3% nos exercícios seguintes.

A Colômbia e sobretudo a Costa Rica ficarão perto de recuperar tudo o que perderam depois da enorme dentada de 2020. Mas não chegarão lá: a primeira ricocheteará 3,5% no ano que vem e 3,7% no seguinte, após encolher 8,3% neste ano, o pior resultado de toda a sua história; a segunda crescerá magros 2% em 2021 para acelerar até 3,8% em 2022. Também ficarão longe as duas maiores potências econômicas regionais, Brasil e México: o primeiro fechará 2022 ainda 1,5 ponto abaixo do nível de atividade prévio à crise ―depois de perder 6% do seu PIB neste ano e recuperar apenas 2,6% e 2,2%, respectivamente, nos dois seguintes―, e o segundo ficará a quase três pontos dessa cota, depois de registrar um retrocesso de 9,2% em 2020 e recuperar-se a um ritmo de 3,6% e 3,4% nos dois próximos exercícios.

Do Brasil, a OCDE ressalta a “forte” resposta tanto fiscal como monetária para fazer frente a uma crise sem precedentes e para evitar males maiores, com programas de gasto social dirigidos aos coletivos mais prejudicados pela recessão. Mas adverte que a recuperação vai demorar a se solidificar e que “alguns trabalhos poderiam não retornar”. Insiste ainda na necessidade de reformas estruturais que melhorem a produtividade, eterna disciplina pendente não só do gigante sul-americano como de todo o bloco.

No capítulo de observações e recomendações, o organismo com sede em Paris acredita que o Chile se beneficiará não só do impulso do consumo doméstico ―graças, diz, à melhora do mercado de trabalho ao calor dos subsídios públicos e das retiradas antecipadas dos fundos de pensões, que acrescentarão um grau adicional de vigor ao consumo―, mas também do empurrão da demanda externa. E o organismo recomenda não descuidar do investimento público, sobretudo em educação, políticas ativas de emprego e infraestruturas, uma eterna pendência no país sul-americano. No caso da Colômbia ―onde quase metade dos trabalhadores está no mercado informal e, portanto, sem acesso aos seguros sociais básicos―, os técnicos da OCDE incentivam seu Governo a “fomentar” a formalização com “impostos mais baixos sobre o trabalho”.

Mais duro se mostra o organismo presidido por Ángel Gurría em sua menção ao México, cuja resposta fiscal à pandemia foi uma das mais tímidas de todo o mundo. A OCDE alerta para o “aumento significativo da pobreza, da desigualdade e da disparidade de gênero” que a crise sanitária e econômica está provocando. “As políticas macroeconômicas devem fomentar a recuperação”, sentencia taxativamente. “O espaço fiscal é limitado, mas a gravidade da recessão justifica intensificar o apoio à política fiscal”, salienta. É uma mensagem que se repete há meses nas análises dos principais organismos internacionais, mas que nem por isso se reflete nas políticas do Governo de Andrés Manuel López Obrador.

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